domingo, 4 de agosto de 2019

A FESTA DO DIA 23...


Tenho a nítida impressão de que meu amigo Ronaldo é um lobisomem, às vezes é claro! Mas tenho! Nunca o vi em uma noite de lua cheia e quando se passa pela casa dele nunca se sente cheiro de fritura e olha que a cozinha dele é perto da rua. Churrasco nem pensar. Eu me pergunto, o que ele faz com a carne que compra? Deve comer crua! Só pode ser!
Desde criança ele é um solitário, parecia que ninguém o compreendia, chegava a ficar cinco ou seis horas sentados sobre a sombra de uma árvores, aliás, esta arvore ficava atráz do nosso campinho.
Foi no verão de 1984/85 que deixei de ser o único a acreditar que Ronaldo era um lobisomem, minha tese ganhava força e eu consegui muitos adeptos naquele sábado de sol. Fazia mais de quarenta graus e Ronaldo não suportando o calor tirou a camiseta preta que usava.
Minha nossa! E dizem que Mata Atlântica acabou! Tudo mentira, só se mudou para o peito do Ronaldo, dezesseis anos e um matagal que Toni Ramos, que nada! Muito mais! “Só pode ser lobisomem”, diziam todos.
Um dia aconteceu o improvável, o absurdo, o que ninguém esperava. Ronaldo apareceu com uma namorada. Logo lhe pusemos o apelido de coyote. A tal da coyote era linda, mas o que nos intrigava era cumprimento dos seus pent... Deixa pra lá.
O namoro fez com que Ronaldo se isolasse ainda mais. Ele e a coyote ficavam as tardes trancadas no quarto a uivar.
Escutávamos tudo debaixo da janela, “uh! Uuhh! Uuuuuh!” Fazia Ronaldo em intervalos de mais ou menos trinta minutos.
Dois lobisomens no mesmo bairro? Quase impossível!
Nossa suspeita se confirmou no verão seguinte. A coyote, ou melhor Letícia, esse era seu nome, não tinha quase pelos no corpo. Foram as curtas roupas de verão que nos possibilitaram esta constatação. Que coxas! Que maravilha! Que raiva passamos, o lobisomem com uma gata e nós chupando dedo!
Foi então, a partir desta situação que começamos a temer pela vida da coyote, opa, Letícia!
Sim!
Imagina quem gostaria de ter um filho mais peludo que o abominável homem das neves? Que come carne crua, uiva pra lua... Tenho arrepios só de pensar!
Algumas vezes Ronaldo até esboçou falar com alguém, mas ninguém entendia nada.
Como?
Ah! Eram uns grunhidos. Sei lá! Alguma coisa do tipo “é mermo”. Mais ou menos assim, entendeu?
E só pra ficar mais estranho ainda, a coyote estava cada vez mais linda. Ronaldo não cortava o cabelo e não fazia a barba há muito tempo. Era uma bola gigante de pelos caminhando pela rua. Um casal impossível!
Hábitos estranhos?
Claro!
Imagina só que o Ronaldo não gosta de futebol!
O que?
Tu também não gosta?
Tá! Mas é diferente!
O que é diferente?
Eu te digo! Ronaldo gosta é de gamão!
Não, não to brincando, ele foi até campeão de um torneio uma vez. Gostar de gamão? Não, não pode ser normal! Não é?
Ah! A coyote. Achávamos que corria risco de vida.
Como sabíamos?
O Anderson, um amigo meu leu numa revista que no final de semana...
Ah?
Sim, no dia vinte e três. Ele leu que nesse dia haveria uma grande festa para lobisomens e afins.
O que são afins?
Bota a cabeça pra funcionar, usa a lógica. O que podem ser afins numa festa de lobisomens?
Não sabes?
Bruxas! Vampiros! Duendes! Boitatá! Mula sem Cabeça! Em fim é como se fosse o “S” do GLS. Entendeu agora?
Era por isso que temíamos pelo futuro da coyote.
Que?
Ah! Sim, o nome era Letícia, mas como todo mundo chama de coyote...
Tínhamos medo que ela fosse sacrificada com uma daquelas adagas de ritual.
Que?
Também tem que te explicar tudo?!
São aquelas facas com a lâmina em “S”. olha o “S” aí de novo. Ah! Ah! Ah!
Não! Não é impossível!
Quem sabe o que rola numa festa dessas? Você já foi a alguma?
Não? Eu não! Nunca! Nem vou ir, por acaso achas que sou louco?
Quem tem coragem?
O Ronaldo tem! Ele foi!
As festas dele são em porões escuros. Uma música muito alta que não dá pra entender. Deve ser algum dialeto para lobisomens. Algo parecido com o Húngaro talvez.
Ficávamos cada vez mais nervosos com a situação. Afinal a mulher mais bonita da vizinhança corria risco de vida. Alguém tinha de tomar uma atitude. Sabe quem foi esse alguém?
Não! Não fui eu! Foi o Pedroco.
Isso mesmo, aquele que está rico no Equador. Ele sempre foi metido a forte. Tomou coragem e peitou o Ronaldo.
O que ele disse?
Hunf! Disse que éramos loucos, que não tinha nada a ver. Ficamos meio sem jeito, sem saber o que fazer, mas era a palavra dele e ele nunca tinha mentido para gente.
Isso sim! Temos que ser justos! Lobisomem ou não, Ronaldo não mentia. Era um cara de confiança. Até trabalhou com o Jorge.
Que Jorge?
O da padaria que é um tremendo desconfiado.
Não sabias?
Também, tu ta mais por fora que a Tailândia da Copa do Mundo.
Não, não desliga. Desculpa. Espera aí que falta pouco.
Acontece que afinal passou o dia 23 e a Coyote voltou intacta. Claro que nós imaginávamos que ela havia sido transformada em lobisomem naquela festa de boas vindas. A turminha dos uivos receberia assim mais uma membro. Lógico né?
Mas na verdade eu não sei não! O João disse que nessas festas vai gente normal também e que isso é só um estilo, se bem que o meu guri acha que tudo é normal.
Diz ele que o som é em inglês, pra mim é bem diferente do que os artistas falam no cinema. Mas que saber acho que não são lobisomens coisa nenhuma. Isso é coisa que não existe.
Eles estão numa boa, casaram e tem três filhos, todos homens e sabe de uma coisa. O mais novo tem uma cara de lobisomem, ainda tomo uma atitude!

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