quinta-feira, 28 de abril de 2011

MORDAÇA INVISÍVEL


POR Cássio de Oliveira Almeida

Eu lembro de uma professora nos tempos da escola, a mais radical de todas, no qual não podíamos abrir a boca para nada, passávamos a aula toda como estátuas, um olhar desconfiado para o lado era sinônimo de advertência, um pensar mais alto era motivo de exclusão da sala de aula, ir ao banheiro? Nunca! Não podíamos pedir, nossas bexigas quase explodiam, quando não uinávamos nas próprias calças. Lembro que ao apontar o lápis, não podíamos ir jogar a sujeira no cesto de lixo no canto da sala, tínhamos que envolver tudo numa folha de papel e somente após a aula, em uma fila Indiana, jogar ni lixo o que tinha que ser jogado.
Nunca demos um piu por medo. Repito, medo! Medo de sermos duramente castigados pela “bruxa”, que naquele momento, não mais era a “tia”.
Lembro de vários professores bons, no sentido literal da palavra. Bons professores, que sabiam lidar com os alunos. Não pensem que eram professores desleixados, não, eles realmente eram bons professores. Reprimiam, mas sem serem repressores. Professores que mantinham nosso interior inquieto, mesmo sendo crianças para entender certas coisas, mantinham a nossa chama acesa em busca de respostas.
Mas infelizmente, a grande maioria eram ditadores transvestidos de educadores, nos ditavam as regras sem poderem serem questionados, da pré-escola ao término do ensino fundamental, nos conduziam de maneira a nos “podar”, de cortar pela raiz a nossa transbordante rebeldia. Rebeldia essa justificada, graças a proliferação natural de hormônios saltando da pele devido ao crescimento, ao natural descobrimento, ao “querer saber de tudo” que é invocada de cada cabeça pensante ao passo que vamos crescendo.

Fomos moldados. Todos na mesma fábrica do saber, ou melhor, na mesma fábrica de aceitar as coisas.

E o que tínhamos que fazer? Aceitar.
Aceitar o que nos era imposto, e assim “aprender” sem espaço para dúvidas, sem espaço para questionamentos. Deus me livre descrer que os Portugueses chegaram ao Brasil aos beijos com os índios, ou questionar a importância nas nossas vidas da fórmula de Baskara.
“_fique quieto menino! Deixa de bobagens...”
Sim, sempre bobagens, é claro.

Lembro que nos faziam rezar Ave Maria e Pai Nosso antes das aulas. Como isso? Agora vejo, olhando para trás, que até a religião nos impuseram. E aí de nós se não quiséssemos rezar, ou deixar escapar um sorriso ao inverter uma frase, como fazíamos ao cantar, obrigados, o Hino Nacional.
Fomos moldados assim. É fato histórico que as escolas sempre impuseram o seu método de ensinar, reprimindo ao máximo qualquer questionamento que pudesse abrir leque para grandes discussões, polêmicas, qualquer coisa que fugisse aos ultrapassados livros didáticos.

Saímos da escola com uma mordaça invisível.

Hoje dentro da Universidade, que eu realmente vejo os reflexos do passado escolar, tanto nos professores, como nos alunos. Muitos deles conservaram e conservam o modelo da fábrica de onde fomos moldados.
Muitos dos Mestres e Doutores professores, ainda mantém o estereótipo da época escolar, vamos dizer assim, um perfil antiquado aos dias atuais. Não evoluíram com o Mundo. Abdicam ao debater com os alunos, a ouvir suas opiniões, contra ou a favor, nas discussões de dentro das salas de aula. Mantém ainda o pulso de ferro sem abrir espaço para grandes diálogos com os estudantes, agora não mais crianças, com os hormônios no pico máximo e o sangue fervilhando nas veias por respostas, por questionamentos e acima de tudo, por uma mudança no cenário atual.
E por que, os inteligentes professores, e não duvido mesmo das suas qualidades e capacidades, ainda mantém esse perfil tão fechado?
Pelo mesmo motivo dos professores escolares. Eles eram alunos, também foram moldados assim. E mais uma vez o medo...
O medo de perder o controle da sala de aula. Enquanto os professores mantém os alunos nas mãos, eles são o poder divino, os ditadores das salas, sem espaço para protestos do povo. O medo então, trocou de lugar. Do aluno, para o professor. O medo de perder o controle, o poder. O mesmo medo dos professores escolares.
Esse é um dos problemas em questão. Os professores, não todos, não conseguem “ter autoridade, sem serem autoritários”. Eles precisam que todos os alunos os temem.

Um dos maiores problemas entre aluno e professor – professor e aluno, é a falta de diálogo. Sempre foi, principalmente na escola quando há, como dito antes, uma “poda” nos galhos que querem crescer demais. E o problema é transportado para as Universidades. Quando um aluno bate de frente com um professor (ideias e opiniões diferentes), há quase um colapso. Pois muitos dos professores não estão preparados para tais enfrentamentos. Resquícios estes vindos de seu próprio ensinamento, afinal, tempos atrás, era ele o amordaçado.

A mordaça invisível que ainda se encontra em muitos alunos universitários, é um problema herdado ainda na escola. Moldados ao silêncio, quando o aluno se depara frente aos colegas e professores na Universidade, muitos não conseguem se comunicar, não conseguem expor suas opiniões, ou as vezes, nem apresentar um simples trabalho perante a sala de aula. Tremem de nervosos, gaguejam e não encontram palavras, ao tentar expor suas ideias para os próprios colegas. Dirão: “_isso depende da personalidade de cada um...” Também, é claro, mas muito devido a formação primitiva nos confins da infância e adolescência escolar.

A mordaça invisível ainda existe. O que vejo, são muitos alunos com ideias e opiniões definidas, debatidas em rodas de amigos, mas não expostas nas salas de aula, por medo de errar, de falar “bobagem”, ou de discordar da opinião dos professores. E quando digo medo, não é o medo marginal, de apanhar, mas o medo intelectual, de bater de frente com o intelecto e vaidade dos professores. Medo de chocar as suas opiniões com as dos professores, e depois do calor da “discussão” (discussão essa necessária para o aprendizado), sentir-se prejudicado e pensar: “_Ah, agora esse professor vai querer me “ralar”, me “rodar”...” Ou pior, quando deixam de lado suas próprias convicções, para concordar e aceitar o que o professor fala, por pura acomodação.

Existe! É fato, eu vejo e sinto no cotidiano das salas de aula. Por isso, muitos preferem se abster, e guardar consigo suas opiniões e dúvidas, por não querer enfrentar, no melhor sentido da palavra, os professores com seus questionamentos.
É a mordaça invisível ainda presente.
Aos amordaçados, que conseguiram se desvencilhar do silêncio, e naturalmente, como tem que ser, expõe suas ideias perante todos, e questionam os professores sobre os assuntos que lhe cabem desconfiança e dúvidas, e que não se calam no obscuro do seu ser, são muitas vezes estereotipados de radicais, polêmicos, e o pior de tudo, denominados importunos. Por ser assim, por serem bem resolvidos, por terem convicções, muitas vezes erradas, com certeza, mas acima de tudo, por pensarem por si só e extravasarem de dentro de si, as interrogações, as incompletas lacunas que formam o seu interior.

Não duvido das boas intenções dos professores, essa classe tão desvalorizada pelos Governantes, que nos forma e que simplesmente fazem parte das nossas vidas. Não duvido, sei da sua plenitude. Classe essa, que quero fazer parte um dia, na mais pura das sinceridades, quero ser um dia, um professor. Por isso todo esse incomodo e inquietação.

Agora, enfim, todos perguntarão: “_quero ver então quando for você o professor, e encarar todos a sua frente com olhos tão famintos que a própria fome...”

não questiono e não duvido de todos os problemas que existem na educação. Mas é através da educação que podemos mudar alguma coisa. História é passado, e não podemos mudá-lo. O presente sim, mudamos a partir do presente, para que mais a frente, o passado esteja mudado para o melhor. É no agora que podemos começar a mudar, no ensinar e no aprender, ouvindo os professores, mas contestando-os sempre quando julgar necessário, por mais absurda que seja o questionamento. As vezes, a absurda pergunta, é a absurda duvida de alguém ao lado, que amordaçado, ficou impossibilitado de falar.
Eu quero fazer parte dessa mudança.

Arranque as suas mordaças, e use o dom da palavra.
É através do diálogo e a luz das ideias, que se quebra o pecado do silêncio e se ilumina os confins da escuridão.

Cássio de Oliveira Almeida

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